sábado, 14 de agosto de 2021

A NOVA MORAL DOS OPRESSORES

Agora,
segundo os donos do mundo,
nada é injusto
no melhor dos mundos.

Bandidos pedem justiça
em nome da moral, da fé, e dos bons costumes,
racistas se julgam incompreendidos,
fascistas reivindicam livre expressão,
e políticos arrotam dignidade.

Os opressores reclamam dos oprimidos
e quase não se fala da imaterial e material miséria
da cultura capitalística.
Ignora-se todo absurdo progresso industrial,
todo o horror colonial,
no elogio cretino dos vitóriosos tempos modernos.




O RIDÍCULO DE SI MESMO

Eu, que não sou ninguém,
me tenho em grande auto estima.

Não temo a morte,
mas considero absurdo
meu desaparecimento do mundo.
Sou, como todos os outros,
que por aí  
andam e respiram,
um grande amante de si mesmo.

Antes de tudo,
me orgulhoso dos meus erros,
dos meus defeitos,
dos meus juizos e prejuizos.

Como é demasiadamente humano
ignorar o ridículo
da consagração da subjetividade,
de identidades que lançam a todos,
uns contra os outros,
à grande fogueira das vaidades!

Me tenho em grande auto estima.
Mas sei que sou nada
entre nadas
sonhando tudo
embriagado por convicções e verdades
no acontecer sem rumo da humanidade.

Ninguém é justo!





terça-feira, 10 de agosto de 2021

IMPERFEIÇÃO



Tudo que existe é imperfeito e incerto.
Mesmo que a imperfeição não exista.
Ela não passa de um juízo de valor,
um pressuposto de qualquer ideal patético,
que sustenta em nós
qualquer platonismo,
enquanto as coisas
apenas são como estão
em perpétuo devir:
um infinito desafio de imaginação,
de criação e imanência,
entre a natureza e o artifício do simulacro de Ser.


O FUTURO

O futuro está sempre do lado de fora da vida.
Ele é, por definição, o inatingível,
o impossível,
contra toda ilusão teleológica de progresso e sucesso.


O futuro é sempre o outro do hoje,
ou sua des-realização radical
no devir que nos interdita
a tranquilidade de qualquer identidade ou conquista.

Estamos todos condenados
a mudança,
a incerteza de nós mesmos 
enquanto o futuro foge.


 

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

MINHA SINA

 

Tenho apenas

os dias,

as noites,

o tempo e a morte,

além de uma tremenda

falta de sorte.

Mas talvez eu veja

o próximo ano,

e lamente as coisas perdidas

enquanto crianças choram

 na maternidade.



sábado, 7 de agosto de 2021

O OUTRO

O outro é um segredo,
um engodo,
ou, talvez,
o extremo ausente de mim mesmo.

Não posso alcança-lo,
sabê-lo,
mas, mesmo assim,
posso perdê-lo
na distância de um encontro.