O mundo cotidiano era formado por
cacos aleatórios de experiências organizadas em pequenas e inúteis rotinas.
No fundo a vida não era lá grande
coisa e era impossível fugir a um constante estado de tédio.
Consumir mantimentos, ouvir um
pouco de musica e evadir-se através de
um bom filme. Isso era tudo que se podia esperar quando não estávamos cumprindo
alguma obrigação. Assim seguia a existência...
Eu me perguntava se a vida não poderia
ser de outra maneira.
As vezes me agradava a ideia de imaginar
como as coisas poderiam ser se não fosse os imperativos da minha pequena realidade vivida. Mas não pensava em termos
de rotinas e atividades. O que me parecia fundamental era a possibilidade da
plena experiência de um sentimento de pertencimento a existência que só poderia
ser garantido por uma pré disposição intima e subjetiva.
Sabia que não havia uma fórmula
universal para se alcançar tal estado. Cada indivíduo possui suas próprias
inclinações e aptidões. As minhas eram definidas por um profundo senso estético.
Logo, me imaginava dedicando a vida a alguma forma de arte, sem
preocupações materiais. Mas não se
tratava de se adaptar ou ajustar a vida coletiva.
Uma vida ideal não estava
associada em minhas divagações a qualquer ideia de perfeição ou de uma
sociedade melhor. Perfeição não passava
para mim de um sinônimo de absurdo e , quanto a uma sociedade melhor....Bom.
Não tenho muitas esperanças ou expectativas quanto ao futuro da Humanidade. A
vida ideal não exclui o advento de dificuldades, alguns porres memoráveis ,
sexo e banalidades.
O ideal era apenas um estado de
espírito onde a gente se perde nos acontecimentos, onde descobrimos prazer em
coisas bobas. Talvez eu esteja falando apenas do resgate daquela ingenuidade
infantil que leva as crianças a descobrir paraísos nas coisas mais bobas. È claro
que uma criança, até certa idade, não pode ser considerada exatamente uma
pessoa. Levamos mais de uma década para nos tornarmos efetivamente parte do
mundo. Eis uma das mazelas de nossa condição humana.
Que fique bem claro aqui que por
vida ideal não entendia absolutamente a plena realização dos meus desejos. Isso
estaria mais próximo de um pesadelo narcisista do que de uma subjetiva idealização da existência. O ideal está em não
enfrentar grandes dificuldades e nem sofrer limitações absurdas.
Vida ideal é simplesmente
responder a uma questão elementar: O que eu precisaria para me sentir bem pelo
simples fato de estar vivo. Confesso que tenho certa dificuldade para responder
satisfatoriamente a esta pergunta.