domingo, 31 de dezembro de 2023

A BANALIDADE DOS DIAS

Hoje é domingo.
Amanhã é segunda feira.
Mas todos os dias são iguais
na prisão das rotinas,
na domesticação dos gestos
e da imaginação.

Somos todos cópias de um modelo ausente.
animais performáticos
construindo o grande espetáculo
de nossas vidas de plástico e algoritmos.

Não importa se é feriado, domingo,
dia de trabalho, de quarentena  ou pandemia.
Todo dia é qualquer dia
em uma sociedade doentia
onde monetarizamos e banalizamos a vida, a morte, a sorte e a ruina .


quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

RENUNCIA SUICIDA

Farto de tanto querer,
de ter, de esperar,
de tentar, perder,
perseverar,vescolher, 
fazer, criar,
e tornar-se entre os outros
através do simulacro de um rosto,
repentinamente desistiu de tudo, sumiu, sucumbiu ,
abraçou o nada e desapareceu.


 Cansado de estar cansado,
partiu sem dar explicações,
sem se importar,
sem ser, sem nada dizer
ou expressar.
Simplesmente sumiu
em súbita e absoluta deserção
ou qualquer despedida 

terça-feira, 12 de dezembro de 2023

FRACASSO

Tudo que temos
é um passado insuportável,
um presente insustentável,
e um futuro inaceitável.

Tudo desde sempre
esteve perdido
na pior versão
de um  mundo amargamente possível.

Tudo para nós
sempre foi menos que nada
e a vida possível
o mais perfeito retrato
de um caso exemplar de fracasso.






domingo, 10 de dezembro de 2023

QUASE FIM DO MUNDO

O tempo passou.
Muita coisa mudou
dentro e fora de nós.

Estamos mais velhos, 
cansados, descrentes
mas,  como sempre,
terrivelmente inadaptados e indignados diante dos fatos.

O tempo passou
e o mundo piorou
com a cumplicidade
de nossas tantas omissões.


Agora,tudo que nos resta,
é contemplar o crepúsculo
profundamente embriagados
com nosso absoluto fracasso.

O dia seguinte não será divino
e muito menos humano
as vésperas de qualquer fim do mundo.




terça-feira, 5 de dezembro de 2023

MARGINÁLIA

Para nós o intransitável
é um caminho,
um meio,
e, muitas vezes,
um fim em si mesmo.

Pois é do impróprio,
do inconveniente,
que somos feitos.

Somos inadequados
ao seu mundo perfeito.
Somos transgressores da lei e da ordem
 que sustentam sua autoridade.
Somos divergentes,
inconvenientes e perigosos,
filhos da necessidade.


sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

A CIDADE CONTRA A HISTÓRIA

A cidade
persiste no mapa.
Mas não insiste,
parece que quase não existe,
nas ruas, prédios e máquinas
que inventam a paisagem dura
que cotidianamente reinventa
a prisão sem muros
de nossas tristes rotinas.

Mas o que define,
 afinal, a cidade
são as ausências que nos atravessam,
como a intempestiva memória,
ou quase presença,
de pessoas e coisas
que, para sempre,
 se perderam de todas as épocas.

A cidade não existe.
Ela é a vertigem de muitos passados
geograficamente organizados
contra toda ideia de indústria, trabalho, ordem e progresso.

A cidade é um desastre contra o futuro.
Um artesanato mudo,
uma arqueologia contra a memória.

A cidade, afinal, persiste
em nome do esquecimento, da preguiça e dos prazeres
que embriagam os corpos.

A cidade é um além do mundo
feito de multidão, chão e absurdos.