MALDITO SEJA O ANO NOVO

Não importa o que ficou perdido

 ou o que será esquecido

 com o ano passado. 

Também não interessa

 se este será meu último ano de vida.

 Hoje é ano novo. 

Precisamos celebrar o futuro.

 Mesmo que para nós

 Já faça muito tempo que ele não exista.

O que importa é que a vida continua, 

apesar de tudo. 

Maltrapilha,

 doente e meio senil, 

ela continua. 

Somos todos suas vítimas.

Maldito seja o ano novo 

Que nos envelhece

 e mata aos poucos

com requintes de covardia!

A REALIDADE CONTRA A VERDADE

A realidade é um estado de errância,

de desabrigo,

ou ausência de mundo,

contra toda ilusão ou esperança

e enraizamento.

Ela escapa a consciência

e desafia o corpo, o verbo,

como exterioridade que nos devora em silêncio.

A realidade é a materialidade da finitude,

é um fugir de tudo em indeterminações e incertezas.

A realidade é o oposto da verdade.

ENTRE FIGURAS E CURTINAS

Entre figuras e curtinhas

vemos o que sabemos

na invenção da realidade.

Sofremos o que queremos

sem enxergar o que sentimos.

Pois a imaginação não cabe em nossa mania de verdade,

como o desejo transcende a sexualidade.

Somos onde fugimos de nós mesmos,

onde o inconsciente existe como potência

que extrapola o verbo

e o corpo, entre as curtidas, rompe o silêncio.

AS LINHAS DAS HORAS

Escreve teu nome nas linhas das horas 

Como se o dia fosse um livro 

Por alguém a ser lido 

Durante o fim do mundo. 

 Escreve como quem morre, 

Como quem foge, 

Ou, simplesmente, escapa

 A armadilha do dia seguinte. 

 Escreve teu nome. 

Depois esquece. 

O dia não é um livro 

Apenas as linhas das horas existem

fora do tempo da tua existência.

CARNE E TEMPO

Somos uma imprecisa mistura de carne e de tempo

 Dentro da indefinição deste instante.

 Fazemos de conta que tudo é para sempre,

 mesmo quando a intimidade das horas escapa a memória. 

Mas o fato é que somos insignificantes, 

nada que nos faz humanos importa 

enquanto a unidade da  carne e do tempo

se desfaz em silêncio.

TUDO É URGENTE E INÚTIL

Tudo é urgente em nossos passados futuros. Nada dura na eternidade do instante 

e a vida pinga sem conta gotas

no abismo frio de um infinito sem rumo.

Tudo é inútil ,

provisório e absurdo,

 Como esses despropositados versos

Mal feitos  de madrugada

em um quarto escuro

 No fundo de um sábado

sem alma.

Tudo é urgente e inútil como os paradoxos que debocham de nossa razão, 

de nossos passados e futuros incertos.

SOBRE NOSSA RIDÍCULA CONDIÇÃO HUMANA

Cada um de nós existe apenas 

para fazer número

no grande espetáculo da miséria humana.

Vivemos para o tédio, para o consumo,

para os jogos de linguagem,

para provisória, banal e inútil sobrevivência

de todos os dias.

Existimos para acreditar e ter esperanças,

fazer de conta que tudo faz algum sentido,

ou que somos inspirados pela metafísica estúpida

de alguma razão que nos transcende os corpos.

Existimos para o ridículo e vergonha do reino animal

Inconscientes de nossa estrutural bizarrice.

CHATICE

Bem sei que

fui uma criança chata,

um adolescente chato,

um adulto chato,

E morrerei como um velho

Absurdamente chato..

Em minha defesa

tenho a dizer apenas

que sobrevivi

 em um mundo

e numa época quase insuportável.

A vida nunca sorriu em meus dias.

A existência, foi para mim,

uma experiência

terrivelmente chata.

APOSENTADORIA

Meu ideal é nunca ultrapassar

os limites do meu quintal.

Jamais ir além das fronteiras de casa,

só saber do mundo por ouvir dizer.

Estou velho demais para o existir comum,

Para pertencer aos outros,

ou me perder em civilidade.

Tenho idades críticas.

Sou livre para não servir para nada,

para não esperar nada do outros,

e recusar o mundo.

ANOS MORTOS

Há anos mortos Enterrados em minha memória Que ainda respiram algum tempo futuro. São eles que antecipam os sonhos Que sonharemos tarde demais Para evitar a sempre eminente catástrofe De alguma nova realidade Que logo nos destruirá Sei que seria melhor não ter nascido e não saber destes anos mortos, destes futuros, e passados Que povoam as ruinas do alguém Que eu já fui um dia. Mas morrer nos faz pensar que apesar destes anos que quase não vivemos jamais seremos mais do que miragem na paisagem dos corpos humanos que enfeitam a terra.

ANTES DO FIM DO ANO

Antes do fim do ano

vou reciclar minhas mágoas,

atualizar minha melancolia,

e renovar meu estado de insatisfação permanente

com o mundo contemporâneo.

Talvez, até vislumbre protestos

na contramão da razão

e do consenso dos conformados.

Antes do fim do ano

vou repudiar o futuro

de nossos eternos passados.

DIA SEGUINTE

Não espere um dia seguinte.

Amanhã sempre é tarde demais.

Seguimos em frente

entre tédio,  ansiedade,

e  lembranças.

Apenas o ontem nos faz presentes.

Mesmo que fartos dos dias,

semanas e anos!

Nada  mais é urgente.

Não espere um dia seguinte.

O amanhã nunca chega

e hoje já tem gosto de ontem.

CIVILIZADOS

Resta-nos agora

apenas o fardo diário

da mais brutal sobrevivência.

Tudo em nós é necessidade

e determinismo.

Somos feitos de fome.

Mas desaprendemos a animalidade,

nos tornamos pequenos escravos

de nossa duvidosa  civilidade,

de nossa detestável humanidade.

Existir nos degrada.

Abandonamos nossos instintos.

Fomos reduzidos a nulidades.

mas, estranhamente,

estamos felizes,

apesar toda vulnerabilidade.

INÚTIL

Quero ser inútil,

imprestável e inclassificável.

Não quero servir ao Estado,

a sociedade ou a qualquer divindade.

Quero ser inútil,

um atentado vivo aos bons costumes,

a moral dominante,

Aos pactos sociais e aos decretos governamentais.

Quero ser anônimo e inútil

até o último dia da minha existência vazia

e anti histórica.

A IMAGINAÇÃO DOS SONHOS

Ainda sonho com as rotinas simples

de uma vida pequena

alimentando infâncias invividas.

Não há realidade

fora da imanência dos sonhos

e a vida não é mais 

do que um passado

que nos devora

na confusão entre fato e ficção.

Tudo é incerto, perigoso,

e finito,

quase um delírio.

Ainda sonho com a simplicidade

das coisas cotidianas e perdidas 

Que nos consomem sem deixar lembrança.

O TRIUNFO DE NOSSA REVOLTA

Nos movemos apertados

Por dias estreitos.

Inventamos nossas vidas

precárias, corrompidas,

e danificadas,

na contra mão do mundo civilizado.

Neste tempo de injustiças,

Não somos heróis ou vítimas,

Mas inimigos do progresso.

Somos aqueles que desafiam,

que resistem,

que não aceitam,

o futuro que nos oferecem morto.

Temos fome de vida.

Queremos o sangue dos ricos,

um mundo livre do Capital,

transfigurado pelo espírito de rebelião e rebeldia.

Amanhã tudo será de todos,

A liberdade esmagará toda autoridade,

seja da terra, seja do céu,

no triunfo de todas as lutas

Na apoteose da mais radical rebeldia.

HORA DO ALMOÇO

A vida fechou para almoço.

Por uma hora vamos fazer de conta

que não odiamos o mundo,

a cidade, o Estado,

e o universo.

Vamos fingir que não sabemos

que deus  não existe,

e a morte é apenas  silêncio,

em um buraco escuro e sem fundo,

onde um corpo se desfaz.

É hora do almoço,

para os que tem o que comer,

para aqueles que, apesar de tudo,

ainda acreditam no futuro

e ignoram que a morte

também tem fome

de sangue e de carne.

É hora do almoço.

A vida parece boa.

Mas ela não  é...

UM DIA QUALQUER

Hoje é sempre um dia qualquer,

sem imaginação ou brilho.

É sobre hábito, odiosa rotina,

e putrefadora inércia,

onde crescem o ódio e o tédio,

como grama de jardim.

Hoje há apenas o mono momento

de uma cela aberta

onde memórias definham

e a morte triunfa sobre o amanhã.

ALGUM FUTURO

Apesar de tudo,

eu espero ter um futuro.

Mesmo que dure pouco,

mesmo que decepcione,

que seja triste,

 que seja duro.

O que importa

é que aconteça

algum futuro.

Mesmo que seja vazio 

e cheio de dias turvos.

OS SEM NOME

O mundo não é feito para nenhum de nós.

Nem a vida se resume a biografias.

A existência é qualquer coisa que nos ultrapassa,

Que nos usa e mata,

para triunfo da espécie humana.

Melhor se perder na floresta.

Deseducar-se,

abominar todos os valores

e princípios da civilização.

Feliz é quem segue indiferente

 a vida, a morte, e a sobrevivência.

Quem se torna extraordináriamente ninguém

e se confunde com as pedras e as árvores,

sem fronteira certa

 entre o dentro e o fora de si mesmo.

ALÉM DO AMANHÃ

Tenho preguiça de pensar além do meu dia.

Afinal, sei que o amanhã é nada,

que o hoje não faz sentido,

e a vida é pura agonia.

Por isso cultivamos tantas mentiras.

Pois a verdade é uma ferida,

uma doença qualquer,

que em nós acorda um outro mundo impossível

onde a realidade dói ao infinito.

Nada tem futuro.

Nada é seguro.

Tudo morre,

tudo muda.

Viva o imprevisível.

Viva o que não tem lei ou controle.

Só o nada é definitivo.

VIDA: TEORIA E PRÁTICA

A Vida não é esta rotina

que nos devora todos os dias,

sem dignidade

ou promessa de final feliz.

A Vida é qualquer outra coisa

que nos roubaram ao nascer,

é a liberdade do sem nome,

o fogo  do ser e do não ser,

que a todos e tudo consome.

A vida é o corpo dos sonhos

que inventam o mundo

e alimentam a morte.

Ela não cabe em nossa medíocre realidade,

Não se conforma as convenções e mazelas humanas.

INVAGINAÇÃO

Poucas coisas me importam hoje.

A maioria delas não cabe em palavras,

nem será por mim compartilhada.

Quase tudo que me importa

demanda solidão,

Me desata da humanidade,

e de toda vocação a verdade.

São coisas feitas de chão.

Perenes e pequenas,

que alimentam o instante

contra a eternidade.

O que me importa

me reduz a esquecimento,

me traduz em corpo e natureza

na invenção de uma casa.

O TÉDIO DO DIA DE HOJE

O tédio do dia de hoje

é o corpo doente de uma vida estragada,

de uma cultura degradada,

reduzida ao mais rasteiro e consensual conformismo.

Agora todos os discursos são mornos,

requentados e requintados

 na medida certa do cinismo.

O tédio do dia de hoje

é a covardia, 

a vaidade e o sucesso

dos que sempre ganham

em tempos de crise.

O tédio do dia de hoje

é nosso medo de pular de vez

no abismo.

NÃO ESPERE UM MUNDO MELHOR

Não espere um mundo melhor,

uma vida melhor,

ou, simplesmente, qualquer boa notícia.

Vivemos dias difíceis

em tempos insuportáveis

e estamos todos condenados a  infelicidade.

O mundo, afinal,

vai de mal à pior

para prosperidade do grande Capital.

Alguns chamam isso de progresso

e comemoram o futuro da humanidade,

desviando o olhar do cadáver que jaz  na calçada de casa.

Não espere um mundo melhor 

CURIOSIDADE

Queria saber onde a noite dorme,

enquanto sigo acordado na madrugada

Pendurado em um céu sem estrelas.

Queria saber se morro hoje

ou depois de amanhã

antes do por do o sol.

Na as hoje só sei que não vivo....

INSIGNIFICÂNCIA

Não fez diferença

o dia seguinte,

o ano seguinte,

ou o futuro dos filhos.

Tudo deu em nada

no tempo que passa

no silêncio que fica.

A existência não faz diferença.

Não me interessa sua biografia.

Da sua vida não ficará marca.

NOSTALGIA

Meu olhar embriagado,

alucinado,

ou, simplesmente, apaixonado

vive afogado em infinitos.

Sei muitos passados acordados na terra que piso,

que me cobre de pó e silêncio,

transformando meu corpo

no labirinto de velhas raízes.

 Tudo que foi persiste

Como saudade e esquecimento

Que a escuridão não resiste.

Eu levo a morte nos olhos ...

DISCIPLINA E BIOPOLITICA

Beba água,

Coma vegetais,

Pratique exercícios

E evacue diariamente.

O resto não importa.

Você não passa de um animal complicado.

E não interessa a ninguém a intimidade dos seus pensamentos.

Eles nem mesmo  acontecem em sua cabeça.

Seu corpo é um mero condutor de signos e símbolos.

Beba água,

Coma vegetais.

DESEDUCAÇÃO

Não serei o reflexo tosco

De nenhum contexto social,

Jamais serei moldado

Por qualquer civilização,

Cultura, geografia, religião,

Ou genética.

Também não serei escravo de nenhuma moral.

Serei indeterminado,

Imprevisível,

Em todas  as possibilidades

Da imaginação e da liberdade de consciência.

Estarei sempre

Além do bem e do mal,

Aquém de suas espectativas.

Fora deste tempo, deste lugar,

E momento.

Serei livre da ilusão de verdades ,destinos, identidades

E conclusões.

 Esquecerei tudo que me ensinaram

Despido daquilo que me tornaram.

Não serei imagem e semelhança de uma sociedade

Que me nega real existência e me condena a suas margens.

INDECISÃO

Não sei o que quero,

O que espero,

ou o que faço,

enquanto o tempo cresce.

Afinal, o que posso ser

ou fazer agora,

enquanto o mundo morre

lá fora,

E minha vontade

Se desfaz nas horas?

Tudo me parece impossível

Diante de tanta vontade

E ilusão de realidade 

PERDENDO TEMPO

Feliz é quem tem tempo

pra perder tempo,

para esquecer do tempo,

e saber no silêncio 

o efêmero segundo

de  uma vida inteira.

Há eternidades

neste pequeno momento 

que se fecha sobre si mesmo,

que alimenta o passado

na contramão do futuro,

Enterrando a gente 

em saudades .

VIVER NIILISTA

Na contramão do mundo

invento minha vida 

sem me embriagar de razão.

Procuro sempre o que não  faz sentido,

o que não é produtivo,

e recusa qualquer explicação.

Viver, afinal, não é calculo,

ideal ou verdade.

Viver é acontecimento,

ser corpo, vento,

natureza e imaginação. 

A vida  não é uma escolha,

mas ser levado

por tudo que é intenso,

na liberdade e no caos

da matéria em movimento. 

CONTRA O DIA DE HOJE

O amanhã não importa.

Nele não cabem nossas urgências.

O amanhã é a morte.

É sempre o dia de hoje

aquela maldita parte do tempo  que dói,

que cansa,

e termina sem qualquer conclusão. 

Todos os dias possíveis são o dia de hoje.

Um desagradável dia de hoje,

 que me mata aos poucos,

sem o alívio de qualquer amanhã

ou juízo final.

Quem me dera poder dormir 

e não acordar novamente para o dia de hoje.

Talvez me surpreender perdido

em qualquer tempo 

anterior ao meu nascimento,

Saber o paradoxo de ser

sem ter, ainda,

se quer existido.

O amanhã seria, então, o meu dia de hoje

e o passado não faria sentido.

ENTRE A VIDA E O MUNDO

A vida não cabe no mundo

e o mundo já não suporta a vida.

Afinal, o mundo é a miseria de nossas ambições

e o conjunto dos nossos fracassos.

O mundo é o pesadelo

de nossa consciência coletiva 

completamente a deriva

em meio a imensidão das coisas.

MUNDO ENÍGMA

O mundo tem o tamanho da minha vida

mas não cabe no meu dia.

Enterrado em rotinas e hábitos 

quase não existo

no se fazer pequeno das coisas.

E sigo como os outros

pela cidade que me ignora

indiferente ao meu próprio corpo.

O mundo é o silêncio da minha vida,

mas me devora todos os dias

ao mesmo tempo que me ignora.

CANSAÇO

Cansado de ontem,

de hoje e de sempre,

faço do meu cansaço 

um estado de permanente protesto,

de má vontade com o mundo,

ou, simplesmente, um modo

de estar a margem de tudo.

Meu cansaço é minha forma mais sincera de desobediência.

INCONFORMISMO COTIDIANO

Preso a vida cotidiana,

a anormalidade mansa

 dos tormentos banais,

me embriago de sono e de tédio.

Mas jamais serei mais um conformado,

um personagem de quadro,

apagado pela paisagem.

Apesar dos sonos e impotências,

haverá sempre rebeldia

nos pequenos detalhes dos meus atos de vida.

A VIDA NUNCA SE RESOLVE

Os anos engordam com o tempo

e a velhice nos consome.

Mas a vida nunca se resolve.

O mundo é sempre o pior dos mundos

na precariedade da existência. 

Alguns ganham dinheiro

enquanto muitos morrem  trabalhando.

A vida nunca se resolve.

Mas continuamos lutando,

acumulando desesperos,

buscando qualquer coisa

maior do que o mundo

e a desordem de todos os governos.

Talvez, nossos netos

resolvam a vida

e nos garantam qualquer dignidade

no silêncio do cemitério. 

Mas a vida nunca se resolve.

DIA A DIA

O dia começa,

o dia termina.

Daqui a pouco

será meio dia.

Todos os nossos atos

conduzem a nada

e o sol não sabe de nós.

Assim justifico minha preguiça,

minha noite íntima e infinita,

que ignora o sol e a rotina, 

o vai e vem cego das horas,

onde o trabalho censura sonhos

e o sono desfaz o dia.

 

 

DESTINO

Chamam destino

aquilo que não deu certo,

a força dos fatos

que quebra desejos

e expectativas.

Mas destino é tudo

que nos contraria,

que reduz o  ego

a ilusão dos fatos.

Destino é um mundo

que não foi inventado

para nenhum de nós

nos contextos criados

pelos nossos atos.

Destino é outro nome

para o fracasso de nossos caplichos,

um modo de negar

o que não tem sentido.

O PARADÓXO DO MOVIMENTO

O caminho não sabe dos pés

nem os pés sabem o caminho.

Pois o corpo e o chão 

conhecem apenas o movimento

livre de qualquer intensão ou destino.

Mover-se é tornar-se inerte

como processo,

é surpreender-se círculo,

incerto no além do ponto e da linha.

POLÍTICA E COTIDIANO

Ferido pela realidade morta

que nos cala a vontade

e pelo silêncio dos corpos

e copos em movimento

tinto de morte,

grito em pileque de boa vontade

qualquer aposta na liberdade.

A realidade exige a alma das coisas

para barganhar mudanças.

A verdadeira política  é sempre perigosa...

A ESPERA DO CAOS

Espero pelo inesperado,

pelo fato inusitado

que desfará a rotina.

Espero pela surpresa

de um pouco de caos

e improviso.

Espero por qualquer coisa

que atrapalhe a paz e a ordem

que tanto nos oprimem.

O inesperado é sempre um desvio,

um convite a incerteza

e a mudança,

contra as espectativas e normas

que nos conformam a realidade.

É preciso criar contra os fatos,

distrair-se da vida,

romper as grades da verdade,

e ousar o impossível. 

O futuro, afinal,

é uma atualização permanente

do absurdo absoluto .

O DIA FORA DA NOSSA EXISTÊNCIA

O dia escapa a existência. 

É maior do que as horas semi mortas

que inventam nossas rotinas.

O dia não tem limites

e acorda na imaginação das crianças,

nos animais de rua,

e no vento que rouba guardanapos

da mesa sozinha 

no bar da esquina.

O dia não espera por nós.

CONFISSÕES DE UM NINGUÉM

Entre derivas e urgências

sonho desistências,

renuncias e evasões.

A vida não  vale

nenhum esforço de guerra.

Não justifica persistências

ou determinação.

Não quero ser nada.

Sou apenas um ninguém

e o mundo não me interessa.

EXÍLIO

Ando cansado de dormir,

de acordar, respirar,

pensar, lembrar,

amar, querer,

sofrer, sonhar,

ou, simplesmente  existir

na banalidade do humano.

Ando cansado das minhas palavras,

do meu rosto,

dos outros,

e de tudo aquilo

que me conforma ao cotidiano.

Ando materialmente cansado de ser.

Metafisicamente exausto

de não ser,

de estar ausente do passado,

a meio caminho do futuro,

e certo da minha morte.

Há tanta coisa acontecendo neste instante.

Há lá fora um mundo que nem imagino.

Mas tudo que sei é que existo

no aqui e agora

deste quarto,

desta cidade,

onde quase não sei da realidade.

MUDAR O PASSADO

Hoje é sempre tarde demais.

É o passado que nos transforma

contra o futuro.

É preciso mudar o que já foi

através da consciência das coisas que vem,

reinventar sempre o tempo presente

onde o ontem ainda nos fala a insuficiência de um provisório agora.

A LIBERDADE DA ESCRAVIDÃO

Acordei sem tempo

para escravidão de ser livre.

Recuso as falsas opções 

de consumo,

o livre arbitrio dos escravos

na fila do pão.

Estou farto de falsas opções,

dos limites das opiniões, 

e de toda forma de indução midiática

no reino da informação.

Quero escolher minhas escolhas,

ir além do sim contra o não.

Inventar outras opções,

ou optar pelo nada

além do vazio das disciplinas.

Quero saber meu corpo nu ao meio dia

sob o sol de verão. 

CONTRA A DITADURA DO PRESENTE

O aqui e agora nos conforma

a miséria do imediato.

Somos constrangidos pela necessidade,

pela brutalidade dos fatos.

Toda nossa impotência

reside na coerção do tempo presente.

O passado e o futuro,

ao contrário, 

definem nossas margens

de liberdade.

Além do imediato

sonhamos o tempo

nas mutações do amanhã

e do ontem.

A vida é devir e indeterminação 

contra todos os tempos da consciência. 

PERMANÊNCIAS

O tempo passou,

nada mudou,

mais a vida

já não é a mesma.

Infelizmente,

Aquilo que muda

nem sempre se transforma.

Qualquer conservação

exige mudança

para sobreviver

aodesgaste

da sua auto ua preservação.

A vida nunca é a mesma,

e vamos sempre

de mau a pior.

UM DIA QUALQUER

Era um dia triste e frio

no qual o mundo

seguia de mau a pior.

Mesmo assim,

estávamos felizes.

Nossa felicidade

não dependia 

dos rumos do mundo,

mas de nossa capacidade

de transformar a vida

vivendo intensamente

a fragilidade de um instante

até suas últimas consequências. 

SISIFO NA CIDADE

É preciso um gole de café

e silêncio 

para bem começar  novamente 

um dia que nunca termina.

É sempre a mesma porta,

o mesmo deserto,

a mesma pedra que cai,

a mesma espera de um sono

contra a rotina.

A ordem devora as horas.

Nada se cria.

Tudo é mimetismo,

necessidade,

fratura exposta

entre eu e o mundo

no deleite da agonia.

MELANCOLIA URBANA

A cidade polui a paisagem

e tudo é urgente

no vai e vem dos corpos.

Todas as horas estão mortas.

Não há sentido nos livros de história. 

Vamos ver o por do sol

como se fosse hoje

o último dia do mundo.

A vida, afinal, não dura pra sempre.

A BANALIDADE DO TÉDIO DIÁRIO

Afogo em mim mesmo

entre o tédio e a monotonia

da banalidade do dia

enquanto espero a hora do almoço 

entre um cigarro e outro.

As vezes penso que já estou morto.

Mas continuo me afogando

engasgado com a fumaça

do cigarro.

Parece que nunca chega

a maldita hora do almoço. 

TEMPOS DIFÍCEIS

A vida segue

incerta e perigosa.

Não há infâncias 

nos olhos das crianças,

nem paz nas palavras

dos velhos.

Tudo é brutalidade

na banalidade da vida cotidiana.

A INSENSATEZ DOS VELHOS

Todo velho

goza do privilégio 

de ser insensato,

inconsequênte,

e imprudente.

Afinal, envelhecer

é adivinhar no corpo

os sinais do fim,

surpreender-se

relativamente

fora do mundo

e a margem do tempo presente.

 

A MORTE DO FUTURO

Nosso futuro morreu prematuro.

Morreu por infecções generalizadas de passados presentes,

morreu pela a atrofia de instantes

até sucumbir a agonia dos tempos.

Seu cadáver jaz enterrado 

dentro de todos nós.

CONSCIÊNCIA DE MUNDO

O mundo será sempre aquilo que é.

Jamais o que deveria ser.

Está condenado ao fracasso

todo platonismo,

qualquer ditadura do conceito

e da verdade moral.

O mundo é vertigem,

corpo e natureza.

É a terra que nos viu nascer

e que um dia nos devorará.

O mundo nunca será o que vejo,

nem se reduzirá a um objeto de desejo.

O mundo é devir,

é um constante tornar-se outro

daquilo que é em nós.

A ÁRVORE E O POSTE

A árvore ereta contra a cidade

relativiza o tempo do poste e da luz,

traduz as trevas da cidade

e ri da humanidade e sua civilização. 

A arvore une o céu e a terra

e reinventa Hermes

contra os desertos dos meus pensamentos.

A vida da árvore  é maior do que a minha.

SOBRE O COTIDIANO

O cotidiano é uma prisão,

uma coleção de opressões,

na nulidade de todos os desejos,

sonhos e vontades,

que concebem nossa vã imaginação. 

No cotidiano, 

Tudo é ilusão. 

Necessidade bruta,

artifício, 

maquinação.

Pouco importa seu rosto ou

seu corpo.

O mundo é feito para ninguém,

e o poder corrompe a todos.

O cotidiano é descretamente brutal construção  social 

da impotência e nulidade

de cada um de nós.

SEM TETO

Quero ir para casa.

Mas a casa não existe mais.

Não há mais qualquer lugar

que me esconda do mundo,

onde a vida seja minha,

e o tempo me abrigue.

Não há mais casa.

Não tenho onde guardar memórias,

acumular a existência,

ou esquecer o trabalho.

Não tenho um canto

contra a cidade,

paredes que me abracem.

Ninguém me espera

para o jantar.

UMA PESSOA MENOR

Descubra seus medos,

gritos e desertos.

Descubra suas precariedades,

seus segredos guardados

nos abismos da humanidade.

Torne-se uma pessoa menor,

um animal sincero,

um ponto de finitude

na duração de si mesmo.

TRISTE COTIDIANO

O tempo arde como fogo

através do tédio dos meus atos.

Oprimem meus pensamentos

os fatos cotidianos.

Tudo é quase impossível 

em minhas rotinas de cosmopolita província.

Entre o mercado e o trabalho

sou quase coisa,

um pouco de gente,

de número,

e paciente.

Ou, quem sabe,

apenas,

um tanto de nada.

A vida segue

e me arrasta.

O tempo queima

consumindo minha consciência. 

Mas nada acontece

nas constantes mudanças 

de um mundo

que evolui do mal ao pior.

O tempo queima.

A vida é fogo.

VIDA COTIDIANA

Nossa existência se resume

a necessidade de três refeições diárias,

beber muita água, 

e ter alguns pensamentos desconexos

sobre a falta de sentido da vida humana.

É isso, que todos os dias,

nos faz sair da cama,

mesmo contrariados,

para suportar rotinas 

que nos consomem

em um mundo que nos devora.

CONCLUSÕES

Não há muito o que se fazer da vida,

e muito menos a se esperar do mundo.

O tempo corre como um rio

onde tudo se vai e se perde

em busca de qualquer oceano.

Nunca alcançaremos o futuro.

Então, resta apenas a preguiça, 

a indiferença,

e esta falta de plumo,

já que a vida se reduziu a apoteóse do inútil

a véspera de algum desastre.

TEMPOS ULTRAMODERNOS

Abandonados pelo futuro,

seguimos agora em um eterno presente em ruinas,

contemplando sempre a iminência 

de alguma catástrofe. 

O TEMPO DA INSÔNIA

O tempo da insônia é quase absoluto.

Dentro dele o mundo parece pequeno.

Toda verdade é mais que relativa,

é, simplesmente, desnecessária,

no absurdo devir das coisas vividas ou inventadas.

PROTESTO TABAGISTA

Acendo um cigarro

contra o mundo.

Fumar é meu ato de protesto

contra essa época trágica

de asfixias.

A vida já não me interessa

onde qualquer existência

vale quase nada,

e quase tudo que me resta

é o acalanto da chama de um cigarro.

PRAGMATISMO E PESSIMISMO

O mundo segue

enquanto a vida

perde o rumo.

Mas tudo que eu penso

é na hora do almoço.

Nunca sei

quando será

o último.

ANOS 20

Estou farto do certo e do errado,

da banalidade do bem e do mal,

do politicamente correto,

do esteticamente aceito,

do moralmente imposto,

e das normas do bom juízo.

Decidi que quero ficar louco,

viver livre e torto,

para brilhar a noite

como as estrelas do céu.

Não espero que nada faça sentido.

Desisti do mundo depois do café da manhã

E  rasguei todos os meus livros.

Agora mesmo, pedi asilo político em um jardim da infância,

adotei um bode preto

e comprei uma garrafa de absinto.

Desisti dos meus futuros,

antes que fosse tarde demais

para viver o amanhã.

O CONFORMISMO DOS REVOLTADOS

Confortáveis em sua retórica de revoltas, aderiram a pior forma de conservadorismo: o conformismo indignado da militância.

O rebanho dos revoltados é o que mais inibe qualquer chance de mudança, pois banaliza a indignação em ocas palavras de ordem 

FALSO SAUDOSISMO

Por onde anda

aquela alegria tonta,

aquele conformismo alienado,

que simulava alegria,

em um mundo desesperançado?

Por onde anda a platéia de auditório,

os idiotas de domingo,

que se forografavam no parque?

Por onde anda aquela vida de faz conta,

aquela burrice conveniente e sadia de antigamente?

MUNDO E MOVIMENTO

Palavras e pessoas não mudam o mundo. Mas o mundo é inconstante, incerto, e fugidio. Muda palavras e pessoas o tempo todo.

O mundo é sempre o que nos foge na banalidade dos ditos e feitos. Ele é tudo o que move, contra as certezas do dia a dia.

O MUNDO VAI MAL

Senta na calçada.

Fuma teu cigarro.

Bebe tua cerveja.

Contemple em segredo,

no anonimato do nada

 o vazio

da existência.

O mundo vai mal

Faça da tua vida

uma experiência

de resistência.

Transforma em luta

tua descrença.

O DRAMA DOS RECEM NASCIDOS

 

A inocência é o único modo de existência saudável.

Mas o amor semi morto dos cuidados exagerados,

sempre enfeita o berço dos recém nascidos com suas patologias.

Afinal, é preciso protegê-los do mundo

que um dia irá devorá-los

e vomitá-los adultos e monstruosos,

como seus pais retardados.

No triste espetáculo da sobrevivência da espécie,

Infelizmente, a infância, dura muito pouco tempo...

INDIFERENÇA NIILISTA

 

Pouco importa o que quero.

A realidade é indiferente

as minhas expectativas.

Nem eu mesmo levo a sério

as minhas vontades.

Sei que amanhã estarei morto

sem nunca saber a felicidade,

apesar de toda determinação e vaidade

que me move.

LIMITE

 

Há sempre um limite,

um vazio de possibilidades,

no fundo escuro

do mais ordinário cotidiano.

Todos se calam sobre isso.

Escondem o lixo sob o tapete.

Mas o limite está sempre a crescer,

e se alimenta do desgaste

de nossas precárias estratégias de sobrevivência.

Um dia o limite não terá mais limites

e será para todos nós

tarde demais para fugir do abismo.

A REVOLUÇÃO DA PREGUIÇA

O dia anoitece sem cerimônias

enquanto, nas horas, nada acontece

no tédio do calendário,

ou no vazio do tempo do relógio. 

 Pertuba  a ordem estabelecida

a preguiça dos corpos.

Mas a cidade pede trabalho

e desigualdades

nos cenários de produção 

de uma vida e razão doentia.

O tempo se perde entre o mercado e a festa.

Mas o dia anoitece

com sede de sonhos

e fome de liberdade.

Que a madrugada rebelde

enforque o dia seguinte,

e queime todos os escritórios,

fábricas e máquinas.

Que triunfe a preguiça

contra um mundo civilizado e atônico.

DESINFORMADOS

Quem sabe notícias

ignora o mundo.

Pois a vida não  cabe

em qualquer narrativa,

sentido, ou relato.

Ela brilha nos olhos arregalados

que contemplam diariamente

o horror da cidade

e os pequenos desastres diários 

que definem nossa humanidade.

UM DIA QUALQUER

Hoje é apenas um dia depois de ontem,

onde nada acontece,

nada é possível, 

e tudo é banal,

na prisão da rotina.

Hoje é um dia comum,

onde crescem em vão ansiedades,

impotências, e necessidades.

Onde o mundo vai mal,

e engarrafamentos pararizam a cidade,

enquando cientistas discutem

o aquecimento global.

Hoje é o dia da morte de alguém,

do aniversário de um desconhecido,

do vencimento de uma conta qualquer,

de alguma tentativa de suicidio. 

Hoje é apenas um dia que não será lembrado nos livros de história. 

Mais um dia qualquer, onde a vida, como sempre, 

não faz o menor sentido.

PARADÓXO EXISTENCIAL

Minha vida é um silêncio 

desfarçado de grito

onde tudo cabe

dentro do tempo do efêmero,

e tão pequeno

que alcanço o infinito.

Tudo em mim é um nada

que não para de crescer

em um exercício realısta

de faz de conta

onde existo na

 imensidão do mínimo. 

CONSPIRAÇÕES E INSÔNIAS

Entre o sono que falta

e a noite que sobra

tenho os pés sobre a corda

das imaginações nuas.

Sei o frágil equilíbrio 

entre o tédio e a angustia.

Nada é definitivo,

tudo é provisório. 

E a vontade corre

na contramão das horas.

Amanhã será outro dia

contra a vida de sempre.

Mas depois de amanhã

esperarei o futuro

para rasgar a madrugada

inventando insurgências. 

VIVA O FRACASSO

Pouco importa o problema.

A solução é sempre o limite,

a perplexidade e o improviso.

Qualquer novidade possível nasce sempre  

De uma certa raiva

de estar vivo.

Pois as coisas mudam no susto,

nas angustias, no grito

no fundo do poço

onde se perde a esperança. 

É preciso provar derrotas,

perdas, e melancolias,

para respirar o inesperado,

morrer um pouco todos os dias,

até surpreender o futuro

no abismo do desconhecido.

Viver é acumular fracassos,

arrependimentos e desgostos,

até o limite do realismo.

FILOSOFIA PARA VAGABUNDOS

Gosto da simplicidade dos dias vazios,

rasos e desertos,

onde o tempo aperta o corpo

e nos perdemos no tédio

das mais profundas inércias. 

No fundo não passo de um vagabundo,

um devoto da deusa preguiça,

que nada espera do mundo.

Não sou feliz,

nem triste.

Sou livre do peso dos objetivos,

dos inúteis ideais da civilização 

e do humanismo.

Sou um livre maltrapilho

que troça dos bem sucedidos,

dos que amam a vida,

e seguem presos a moral banal

de qualquer princípio e conclusão universal.

Gosto de dispor do tempo

para ser ninguém, 

para não fazer nada,

e esquecer que existo.