quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

ANOTAÇÕES AUTOBIOGRÁFICAS DE UM VAGABUNDO II

Eu havia me habituado a ficar sozinho. Afinal, esta era uma condição para não se fazer nada. Podia ficar deitado o dia inteiro, enterrado em mim mesmo tipo um morto vivo sem que qualquer pessoa me enchesse o saco por isso.

Era ótimo ficar prostrado e, as vezes, cochilar e sonhar um pouco. Sempre sonhava com uma realidade melhor e sem paralelos onde as paisagens tinham um gosto de antigamente. Mas quem ainda pode entender isso?

O fato é que meu oficio mais caro era não fazer absolutamente nada. Apenas deixava o tempo passar e pensava na morte.  Claro que morreria um dia. Eu ficava tentando antecipar como seria. Fazia disso uma espécie de loteria. Pensava em atropelamentos ou em morte natural e prematura. Um enfarto fulminante, talvez, antes dos cinquenta anos. Mas provavelmente conseguiria  avançar mais um pouco, apesar do cigarro.

Ficar sozinho e sem fazer nada acordava a imaginação. De certa forma as minhas inércias sempre eram muito produtivas. Mesmo que não me levassem a lugar nenhum. Mas nada leva a lugar nenhum. Só os idiotas não sabem disso.

Mas eu ficava deitado o tempo todo que podia porque, absolutamente, não tinha para onde ir. Poucos homens tem realmente um destino, um objetivo alcançável e satisfatório. A maioria vive da porcaria das rotinas sem sentido e se matam para ganhar dinheiro que só dá dor de cabeça pra ser gasto e sustentar uma infinidade de contas e despesas asquerosas.

Era melhor ficar parado, ali, sem fazer nada e esperando a morte.

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